Cantinho Cultural

A Escola Pitagórica

por Luiz Roque professor, poeta e escritor   

Grécia: A Escola Pitagórica

Fundado pela lendária figura de Pitágoras, não sabemos bem desde quando ou até quando o pitagorismo foi uma escola para iniciados ou para uma elite esotérica reduzida. Este aspecto do pitagorismo se deve à sua ligação com o orfismo (de Orfeu ), que tinha essas características.

A verdade é que, desde cedo, os pitagóricos se voltaram para o número natural. Analisaram-no sob todas as formas. A importância que atribuíram aos números, associada ao caráter místico da Escola, conduziu os pitagóricos a verem nos números mais do que uma criação da mente humana ou um ludismo inteligente.

Eles descobriram “forças” nos números, propriedades eficientes, ações sobre a vida, poderes proféticos. E chegaram a considerar que as coisas eram feitas de números, que os números eram a sua FÍSIS. Eles são os primeiros que, com suficiente clareza, colocam a importância do número:

“Todas as coisas têm um número e nada se pode compreender sem ele”, diz Filolau.

A História tem de reconhecer nos pitagóricos os primeiros a vislumbrar a importância do quantitativo(futuro da ciência) e o fato de que o conhecimento quantitativo é mais completo e engloba o qualitativo. Assim, pois, Pitágoras e Heráclito são precursores da Dialética moderna.

Para relacionar um número a cada coisa, os pitagóricos acreditaram na existência de mônadas, unidades mínimas, de forma que cada coisa seria formada por um número inteiro de mônadas. A Escola apresentou mais de uma demonstração do chamado “Teorema de Pitágoras”, que será dispensada aqui, por ser bastante conhecida. Parece, entretanto, que este teorema já era conhecido de egípcios e babilônicos.

Os pitagóricos relacionavam números com fatos e entidades. Por exemplo, 3 era o número da Justiça e 4 o do casamento; 1(um) é a união, a coincidência entre o finito e o infinito (?).

Criaram, também, os conceitos de números abundantes, deficientes e perfeitos:

a) Abundantes: são aqueles cuja soma dos seus divisores é maior do que ele. Por exemplo, 12 admite os divisores 1, 2, 3, 4, 6, que somam 16.

b) Deficientes, cujos divisores apresentam soma menor que o número. Por exemplo, 8 admite os divisores 1, 2, 4, que somam 7.

c) Perfeitos, cujos divisores têm soma igual ao número dado: 496 é divisível por 1, 2, 4, 8, 16, 31, 62, 124, 248, que somam 496!!

É claro que estes números sempre se relacionavam com influências mágicas. Modelarmente perfeito e, por isso, pleno de magia era o número 6, cuja soma (1+2+3) e cuja multiplicação (1.2.3) dos divisores produzem ambas o número 6.

Também é mágico o número dez (tetrarkys): 1+2+3+4.

A orientação dos números em formas determinadas é o que foi chamado de “séries gnômicas”.
A distribuição dos números ímpares 1+3+5+7+... conduz a figuras quadradas e a somas que são segundas potências de números.

Daí por que estas segundas potências são chamadas quadrados dos números:

  Notemos que as somas 1, 4, 9, 16 são quadrados, porque resultam de figuras com a forma de quadrado.

  1 = 12
  1 + 3 = 22

  1 + 3 + 5 = 32
  1 + 3 + 5 + 7= 42
  1 + 3 + 5 + 7 + 9= 52

  Hoje, escreveríamos: S = n2

A distribuiçao dos números pares, por sua vez, forma um retângulo (números retangulares):

  Notando que:
  2 = 1+ 12
  6 = 2+ 22
  12 = 3+ 32
...

  Nossa expressão geral seria:
  N = n+ n2

Os números 2, 6, 12, 20....são chamados números retangulares.

Finalmente, a distribuição dos números naturais forma um triângulo e, por isso, eram chamados, pelos pitagóricos, de números triangulares.

          o                   1
        o   o                3
      o   o   o             6
    o  o   o   o          10
  o  o  o   o   o        15

 

Notando que: 
1 = 1x2/2
3 = 2x3/2
6 = 3x4/2
10 = 4x5/2
...
a nossa expressão geral para números como 1, 3, 6, 10, 15.....seria:

n = n (n+1)/2

As Médias Aritmética, Geométrica e Harmônica (ou Subcontrária)

Os pitagóricos apresentaram essas três conhecidas médias de forma bastante curiosa. Nas expressões seguintes, considere que a média é sempre representada pela letra b:

Média Aritmética

(a-b)/(b-c) = a/a

Esta curiosa forma de escrever é equivalente a que h oje fazemos:

b= (a+c)/2

Média Geométrica

(a-b)/(b-c) = a/b

Note o leitor que dessa sentença resulta que b 2 = ac.

Hoje, fazemos: b = (ac)1/2

Média Harmônica

(a-b)/(b-c) = a/c donde resulta: b= 2ac/(a+c)

que é o mesmo que obtemos hoje, ao definir a média harmônica entre a e c pela fórmula:

b = 2 / (1/a + 1/c) 

Nicômaco de Gerasa (séc. I DC) escreve:

”A proporção harmônica se exprime, de ordinário, por frações, quando relacionada com a música que, segundo a lenda, deu ensejo à sua descoberta.”

Exemplo:  6, 8, 12 ou 1, 4/3, 2

O nome subcontrária provém do fato de que, se b é média harmônica entre a e c, então 1/b é média aritmética entre 1/a e 1/c.

Exemplo:  6, 8, 12 e 1/6, 1/8 e 1/12

Note-se a relação entre esta média harmônica e o cubo, figura perfeita. A grande glória para os pitagóricos foi verificar que os números 6 e 12 e as suas médias correspondiam aos comprimentos das cordas dos instrumentos musicais: a lira tetracórdio dos gregos tinha cordas na proporção: 6 : 8 : 9 : 12 ou 1 : 4/3 : 3/2 : 2

Quando tangidas estas cordas (mantidas constantes a constituição e o diâmetro), fornecem,respectivamente, as notas do, fá, sol e do(de 8.ª ), resultando, entre duas notas consecutivas, um intervalo musical de Quarta; entre duas alternadas, um intervalo de Quinta; e entre os dois extremos, um intervalo de Oitava:

DÓ           FÁ        SOL             DÓ
6                8          9                 12
!<--quarta--->!                              |
!<----------quinta----> |                    |  
<--------------------oitava----------------->|

É provável que o som de percussão (a música primitiva) tenha sido superado inicialmente pela lira monocórdio (com o instrumentista fazendo os intervalos com os dedos), vindo, depois, a lira tetracórdio, a lira heptacórdio, a decacórdio e a dodecacórdio.

O Número Irracional

Não se sabe se foram os pitagóricos ou os seus críticos de Eléia que vislumbraram por vez primeira o número irracional.

Para visualizar isso, considere um triângulo retângulo de dois catetos iguais:

Vamos partir do conhecido Teorema de Pitágoras, que dá o valor da hipotenusa em função dos catetos, através da fórmula:

a2 = b2 + c2

Sendo b= c, temos:

a2 = b2 + b2

a2 = 2b2 

Vamos supor que a hipotenusa a e o cateto b sejam comensuráveis, isto é, que exista o racional m/n irredutível, tal que:

a = (m/n) b

Seja, por exemplo, m par. Então, n terá que ser ímpar, pois trata-se de uma fração irredutível.

Por Pitágoras, sabemos que: a2 = 2b2 

elevando ao quadrado ambos os membros da igualdade a = (m/n) b, teremos:
a2 = (m2  / n2 ) . b2

2b2 = (m2  / n2 ) . b2

Logo, m2 / n2=2

Donde: m2 = 2 n2

Como m é par, segue-se que m2 é divisível por 4, o mesmo ocorrendo com 2 n2

Logo, n2 é divisível por 2 e n também, o que contradiz a hipótese de que n é ímpar.

A existência do irracional vinha abalar o edifício pitagórico, que considerava todas as medidas como dadas por números discretos de mônadas. Esse abalo iria levar a ciência grega para o imobilismo, o qualitativo e a forma. Na Matemática, para a Geometria.

Logo, viria Platão.   
  

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