desenredo, subst.
masculino -
ação ou efeito de
desenredar (-se);
      * * * * * * DESENREDO * * * * * *      
Site idealizado por José Carlos Corrêa Cavalcanti (2005)
desenredamento;
desprender-se da rede;
separar-se do que
está enredado.

Os árduos caminhos da transformação interior
Uma reflexão sobre os estados de consciência na busca da sabedoria

José Carlos      (17/Agosto/18)

Uma possível classificação dos estados de consciência dos seres humanos (sem qualquer pretensão de ser a única nem a melhor) seria:

1º) Aqueles que nem suspeitam minimamente que há uma realidade não produzida pela imaginação nem formada por pensamentos, crenças, ideologias, sensações e emoções — o que constitui o mundo da mente, no qual:

      a- Só é verdadeiro aquilo que provém das impressões sensoriais, da ciência, da tecnologia e do raciocínio lógico;

      b- O que importa são as coisas concretas, utilitárias, e as emoções
      que surgem dos sentimentos de apego e aversão a essas mesmas coisas;

      c- O que faz sentido são as teorias e ideologias que interpretam e explicam a realidade física e mental;

      d- O que buscamos (no sentido psicológico) é encontrar fundamentos filosóficos ou crenças religiosas
      que diminuam ou acabem com nosso medo da morte, da impermanência e da luta do bem e do mal.

Nesse nível a verdade é relativa, pois depende do referencial (conjunto de pressupostos tidos como verdadeiros) de onde se observa. Raramente se pensa em transformação interior, e quando esta se impõe (a partir de uma situação de sofrimento), é entendida como o automelhoramento horizontal, por meio da disciplina do pensamento e dos hábitos (via esforço e repressões internas), e aquisição de novos conteúdos, sempre visando a usufruir de recompensas futuras;

Esse é o estado de consciência de ego, o qual abarca a imensa maioria da humanidade.

 

2º) Estados que têm noção intelectual da existência de um espaço de consciência transcendente ao mundo mental e se interessam pelo assunto, mas não tiveram experiências correspondentes, permanecendo no campo da teoria. Trata-se de um estado relativamente raro, que exige amor ao autoconhecimento e perserverança; acompanhado de humildade, será a base de ulterior transformação;

3º) Estados que tem noção da transcendência da mente e já a experimentaram, mas não têm estabilidade nela, e assim as pessoas nesse estado expressam-se na maioria das vezes como a consciência de ego, mesmo que achem que estão expressando a Consciência Pura.
A instabilidade desse estado torna-o delicado, sobretudo quando traz prematuramente a ideia de transformação ou iluminação (o que pode originar declarações fundamentalistas e gerar autoritarismo, intolerância e inimizade).

4º) Estado de consciência de sabedoria, em larga conexão com o Espírito, de forma estável, na vivência de um espaço transcendente e superior aos pensamentos, cultura, crenças, ideologias e emoções. É o estado onde se encontram os grandes sábios da humanidade, raríssimos em todos os tempos e lugares.

 

Por isso, uma coisa fundamental na busca de sabedoria é ter bem clara, para nós mesmos, questões como:

- "De ONDE é que eu estou falando? Que grau de autenticidade têm minhas palavras?"
- "Estará meu comportamento em consonância com minhas palavras?
- "Que lugar tem a compaixão em minha vida?"

Observe que é dos níveis 1º, 2º e 3º que surgem os julgamentos, as concordâncias e divergências, as palavras ácidas, a intolerância, as mágoas, as simpatias e antipatias. Isso mostra os perigos e armadilhas a que estão sujeitos os buscadores da sabedoria. O nível 3º é especialmente perigoso, pois nele o ser humano, perdendo a humildade, pode achar-se "dono da verdade", tendendo a condenar quem não pensa da mesma forma.

A atenção é o instrumento da subsistência de todas as formas vivas. Na espécie humana, no entanto, existe o extraordinário fenômeno do pensamento simbólico para representação dos objetos do mundo, na forma de nomes e imagens das coisas percebidas.

Isso faz com que, em nossa espécie, a atenção — fenômeno impessoal e vazio de conteúdos próprios — fique aprisionada a pensamentos, desejos, emoções. Ora, essa é a MISTURA mental que compõe nossa CONSCIÊNCIA PERCEBEDORA: atenção + memória. É com essa entidade híbrida que percebemos o mundo.

A atenção á a parte substancial, viva da percepção do mundo, está sempre no presente e não tem conteúdos para chamar de seus; porém, com a memória, que é a parte inerte da percepção do mundo (um banco de dados de palavras e descrições), sucede exatamente o contrário — está sempre no passado e tem por função rotular e descrever as características das coisas conhecidas.

Ora, os objetos do mundo são os meios que o ser humano busca não apenas pela necessidade de sobrevivêencia, mas principalmente pelo desejo de prazer e medo da dor. Por isso, na vivência cotidiana, A MEMÓRIA PREPONDERA LARGAMENTE sobre a atenção.

E ISSO CORROMPE A CONSCIÊNCIA PERCEBEDORA, da qual surge um "eu" fundamentado na memória. O eu assim construído é o ATOR QUE interpreta as narrativas da memória, identificado com os personagens que emergem dessas narrativas, sempre encenando algum script do passado ou do futuro, numa busca incessante de prazer, significado e propósito para sua existência.

A parte viva da CONSCIÊNCIA PERCEBEDORA — a atenção, que é PRESENÇA e cuidado, acaba se resumindo ao papel de ser apenas um meio para um fim, o suporte vivo para o desejo de continuidade da matéria por meio da memória.
Por isso, é uma enorme contradição a busca religiosa no estado de um "eu" totalmente materializado e que nega ou desconhece o Princípio divino em si mesmo.

É preciso separar-se o grosso do fino (ou seja, separar a memória da atenção), do contrário o buscador estará centrado numa falsa identidade, fazendo o papel do ladrão fantasiado de guarda que é chamado para investigar roubos numa cidade, como nos conta uma antiga e incrível metáfora budista.


 


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