Mendigos

Poesia de JIRI WOLKER - Poeta polonês (1900-1924) - Tradução de Jonas Negalha - Coleção Mákua


MENDIGOS

Um dia o Bom Deus apareceu à minha porta
com trajes de mendigo,
um alforge e um bordão.
Vinha de longa jornada e certamente
dormira sobre o feno
porque cheirava como os campos de Julho.

Chegou-se à porta e pediu esmola.

Eu estava nesse dia carregado de coisas maçadoras
que nos pesam e sufocam,
vestido de negro, bom colarinho,
muitos livros, muitos livros,
e como tinha comido bem
meditava seriamente no mistério da morte e da vida.

Não lhe dei nada. Não tinha braços.
Estavam tão ocupados.
Mas senti vergonha,
ante aqueles olhos cerúleos
de oriente e ocidente.

O Bom Deus partiu. A porta ficou aberta.

Um dia esta porta me verá sem colarinho e sem livros
e terei também um alforge e um riso infantil,
uma tristeza enorme e um grande saco de desgostos
e uma recordação transparente de minha mãe.

Agora vou errando pela cidade em busca do Bom Deus
e sei que Ele deambula por lá com alforge e bordão
e sei que O encontrarei um dia
mas não hei de temer o Seu encontro
porque não estou carregado de coisas maçadoras.

Ele me levará consigo. Iremos para a esquina de uma rua
com o barrete na mão e o sol ardendo sobre as nossas cabeças:

"Tende piedade, gentes de Deus,
abri os vossos corações!" 
 

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